Por Josep Iborra Plans, em CPT
No dia 16 de junho de 2025, o vereador Silvano Pessoa, de Vilhena (RO), encontrou três corpos carbonizados nas cinzas de uma casa queimada. A vítima era Josenir Vieira de Oliveira, de 57 anos, um pequeno agricultor que residia na Linha 140, a 60 km da cidade. Este trágico evento é considerado um novo massacre no campo de Rondônia, uma área já marcada por conflitos e violência agrária.
Ainda sem confirmação por exames de DNA, acredita-se que os restos mortais sejam de Josenir, seu parente Álex Oliveira, de 44 anos, e sua companheira, Luciana Cristiano de Souza, de 36 anos. Álex e Luciana estavam desaparecidos desde 14 de junho, quando anunciara uma visita ao sítio de Josenir e não retornaram nos dias seguintes. Álex atuava como assessor do vereador Silvano.
Josenir havia sido eleito presidente da Associação de Pequenos Produtores do Vale do Lambari (ASPROVAL) em abril de 2023, uma organização que ele ajudou a fundar e registrar legalmente. A ASPROVAL representa famílias que ocupam pacificamente a área do Vale do Lambari, que se situa próxima à Fazenda Vilhena do Pensamento, um antigo latifúndio que já foi palco de diversas chacinas, incluindo um massacre em 2015.
Em março, Josenir procurou o vereador Silvano para reportar invasões em seu sítio por grileiros e ameaças que havia recebido. Ele deixou o cargo na associação devido a desavenças relacionadas a essas invasões e fez denúncias sobre planejamentos de assassinato contra ele. No dia 14 de junho, Álex comunicou ao vereador que iria visitar Josenir, mas após dois dias sem notícias, Silvano descobriu os restos dos três no sítio na segunda-feira (16).
As invasões de terras de pequenos agricultores podem ser a causa deste massacre. Relatos de moradores indicam a presença de milícias armadas e capangas de madeireiros em áreas indígenas e em terras em litígio agrário nas proximidades da Fazenda Vilhena. A polícia judiciária está investigando o caso.
Além disso, as comunidades locais apontam que a atuação de escritórios de técnicos que cobram tarifas exorbitantes tem exacerbado os conflitos. Esses grupos fazem georreferenciamento e CAR de forma irregular nessas áreas, enquanto lideranças corruptas especulam em terras públicas, garantindo regularização fundiária sem possuir os direitos legítimos.
O massacre no campo e a relação com a Lei 14.757
Existem suspeitas de que essas novas grilagens de terras e o massacre possam ter sido facilitados pela Lei 14.757/2023, que oferece perspectivas de anistia a grileiros ao conceder terras públicas a antigos licitantes que não cumpriram os termos de seus contratos na Amazônia.
Consulte aqui a Nota Pública emitida por organizações de Rondônia, alertando sobre os perigos dessa lei para a grilagem de terras no estado.
A referida lei anistia cláusulas resolutivas de áreas de até 960 hectares, dispensando o pagamento de terras públicas. Mesmo sem cumprir os compromissos contratuais, ela entrega terras da União a titulares de contratos da época da ditadura militar — muitos dos quais nunca estiveram em Rondônia ou ocuparam as terras. Durante sua tramitação, a Câmara dos Deputados chegou a aprovar anistia para áreas de até 2.500 hectares, mas o Senado manteve o limite original, mesmo com a pressão contínua dos grileiros para apropriar-se de terras públicas para fins especulativos e de monocultura para exportação.
A lei foi aprovada pelo Congresso em 2023, desconsiderando um parecer da AGU e o veto do Presidente Lula por inconstitucionalidade. Sua implementação pode afetar milhares de pequenas famílias de agricultores no Cone Sul de Rondônia, na região de Ariquemes e em outros estados da Amazônia. Os posseiros legítimos que habitam e trabalham nesses locais há décadas, buscando assentamento ou regularização fundiária, são frequentemente impedidos por antigos títulos provisórios, muitos dos quais já foram anulados pelo Incra ou que estão em fase de verificação de compliance. A situação volta a incentivar a violência e o saqueio de terras públicas na Amazônia.
É importante ressaltar que o Brasil já possui normas que poderiam ser aplicadas para resolver a questão das titulações para pequenos agricultores. Contudo, a falta de transparência em interesses do agronegócio e a ineficiência dos órgãos em atender essas famílias contribuem para a legalização da grilagem na Amazônia.
*com informações da CPT Regional Rondônia
–
Ainda que os corpos estejam sem identificação imediata devido à condição em que foram encontrados, pode-se confirmar que Alex, sua esposa Luciana e seu parente Valdenir são as mais recentes vítimas do massacre no campo em Rondônia. Foto: imagens divulgadas na imprensa
Leave a Comment