Vale de juízes de RO dá para almoçar e jantar no Outback todo dia

Em 2025, magistrados de um dos Estados mais empobrecidos do Brasil receberam, em média, R$ 4.126,57 mensais a título de auxílio-alimentação.

Os juízes do Tribunal de Justiça de Rondônia têm recebido esse valor desde o início do ano, o que equivale a R$ 187,57 por dia útil, considerando um mês com 22 dias.

Esse montante é suficiente para refeições em restaurantes que são considerados caros para a maioria da população brasileira. No Outback, por exemplo, pratos do menu executivo começam em R$ 49, e o refil de refrigerante custa cerca de R$ 18, totalizando R$ 67 para uma refeição.

No Madero, que também é uma rede de restaurantes de maior padrão, o filé mignon pode custar R$ 89, permitindo que os juízes façam até duas refeições por dia dentro do auxílio concedido.

Além disso, esse valor é capaz de comprar mais de quatro cestas básicas das mais caras em São Paulo.

Conforme ilustrado no infográfico, o Tribunal de Justiça do Acre é o segundo que mais paga auxílio-alimentação, com um valor médio de R$ 3.882,70 por mês, equivalente a R$ 176,49 por dia útil.

Outros seis tribunais, incluindo os do Amazonas, Amapá, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Pará e Rio de Janeiro, também oferecem auxílios acima de R$ 3.000 mensais.

Esses dados foram compilados pelo Poder360 a partir dos contracheques dos juízes, fornecidos pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Apenas magistrados ativos foram considerados, e aqueles que receberam R$ 0,00 foram excluídos do cálculo.

Nos tribunais federais, todos os valores de auxílio-alimentação são superiores ao salário mínimo (R$ 1.412,00), mas não atingem os altos valores dos tribunais estaduais.

Vale de juízes de RO dá para almoçar e jantar no Outback todo dia

O auxílio-alimentação para juízes no Brasil se soma a outras vantagens que fazem com que seus salários atinjam valores muito elevados.

Em 2024, o Poder360 reportou que juízes receberam salários brutos mensais superiores a R$ 100 mil em pelo menos 63.816 casos.

Essas quantias foram possibilitadas pela soma de salários, indenizações e auxílios diversos, elevando a remuneração a mais de R$ 1 milhão em 28 situações.

Os altos valores de auxílio-alimentação neste início de ano podem ser atribuidos ao pagamento de retroativos. Contudo, os tribunais que mais pagaram não detalharam o processo de determinação do valor desse auxílio.

Para comparação, a renda média mensal per capita de Rondônia é de R$ 1.717; assim, o auxílio dos juízes é 2,4 vezes superior a esse valor.

TRIBUNAIS SE MANIFESTAM

O Poder360 procurou todos os tribunais para comentários sobre os dados apresentados.

Os Tribunais de Justiça da Bahia, Minas Gerais, do Distrito Federal, do Ceará e do Mato Grosso afirmaram que os valores são legais e estabelecidos por resoluções internas.

O Tribunal de Justiça do Paraná optou por não se manifestar.

Os demais tribunais não responderam até a publicação desta reportagem; o espaço para comentários permanece aberto.

MOVIMENTO CONTRA OS SUPERSALÁRIOS

Cerca de 10 organizações da sociedade civil lançaram, em 9 de abril de 2025, um manifesto contra os supersalários no funcionalismo público. O documento clama por “uma política remuneratória justa, em conformidade com os princípios constitucionais da moralidade, legalidade e eficiência”.

Segundo o manifesto, as despesas que ultrapassam o teto constitucional em 2023 custaram pelo menos R$ 11,1 bilhões ao erário, isentas de Imposto de Renda.

Com esse valor, seria possível financiar o Bolsa Família por um ano para 1,36 milhão de beneficiários ou proporcionar o programa Pé-de-Meia a 3,9 milhões de estudantes do ensino médio.

Os supersalários são concedidos a uma minoria; apenas 0,06% dos servidores públicos brasileiros recebem remunerações que superam o teto de R$ 46.366,19 em 2025.

Assinam o manifesto o Movimento Pessoas à Frente, a Fundação Tide Setubal, a Transparência Brasil, entre outros. A íntegra do documento está disponível em PDF (311 KB).

O grupo sugere nove medidas para acabar com os supersalários:

  • novo projeto de lei – que classifique de forma adequada as verbas remuneratórias e indenizatórias;
  • classificações – para as verbas indenizatórias, que devem:
    • ter natureza reparatória, para ressarcir despesas dos servidores;
    • ser eventuais e temporárias, não incorporadas mensalmente;
    • ser criadas por lei, não por atos administrativos.
  • impostos – correta aplicação do Imposto de Renda para aumentar a arrecadação federal;
  • transparência – criação de mecanismos de governança e transparência sobre a remuneração no setor público;
  • legislação – imposição legal para a criação de qualquer adicional ao salário, mediante aprovação no Congresso Nacional;
  • descrição de verbas – extinção de verbas indevidamente classificadas como indenizatórias;
  • efeito cascata – proibição da vinculação automática entre salários de agentes públicos;
  • penalidade – considerar a autorização de pagamento não legislada como improbidade administrativa;
  • pagamentos retroativos – criação de barreiras para os pagamentos retroativos, incluindo limites temporais.

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